Edição 153 – Cimento da cidadania
Ambiente de canteiro de obras transforma a vida de jovens do Baixo Sul
1 de abril de 2011
Ambiente de canteiro de obras transforma a vida de jovens do Baixo Sul
1 de abril de 2011
texto: Gabriela Vasconcellos
foto: Márcio Lima
Em meio a blocos de concreto, cimento e areia, o brilho do batom e os cabelos soltos de Denise Batista chamam atenção. Aos 26 anos, a pedreirinha, como é carinhosamente chamada pelos colegas, não se considera vaidosa, mas gosta de expor seu lado feminino. “Quando estou de farda, pareço um homem. Quero que as pessoas percebam que sou uma mulher.” Moradora de Igrapiúna (BA), ela ingressou na turma piloto do Construir Melhor projeto ligado ao Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Mosaico de Áreas de Proteção Ambiental do Baixo Sul da Bahia (PDIS), instituído pela Fundação Odebrecht. O projeto capacita agentes multiplicadores da construção civil na região.
Uma das poucas mulheres entre os 43 aprendizes das duas primeiras turmas, Denise sempre mostrou curiosidade pela profissão exercida por seu pai e irmão. “Sou apaixonada pelo que faço. O trabalho é pesado, mas, quando você gosta, se torna fácil. É o que escolhi”, garante com firmeza. De acordo com Christophe Houel, Líder Educador, durante a seleção dos participantes, o talento de Denise já a destacava. “Hoje está comprovado”, ele afirma.
Denise e os colegas estão aprendendo não apenas a levantar paredes, mas a desenvolver sua cidadania. “Nosso desafio é a formação de pessoas”, salienta Houel. O curso é o único de longa duração oferecido no Brasil, ministrado em 18 meses, em regime de alternância. Mensalmente, os educandos passam uma semana na sala de aula aprendendo conceitos teóricos sobre informática, português, matemática, comunicação, elaboração de projetos, orçamentos e plano de vida e carreira. Nas outras três semanas, é oferecido o acesso a conhecimentos práticos no canteiro de obras, com acompanhamento de monitores, encarregados e engenheiros.
Apoiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Construir Melhor tem sua sede em fase de implantação no município de Valença (BA), em terreno doado pela Prefeitura. Até maio de 2011, a obra deverá estar concluída. Os aprendizes estão trabalhando na execução das instalações, que abrigarão laboratórios de marcenaria e informática, fábrica de blocos, salas de aula e alojamentos. Essa é apenas mais uma das experiências práticas vividas pelos educandos, que já atuaram na construção de habitações com 65 m no Loteamento Nova Igrapiúna, de uma fábrica, no município de Laje (BA), e da sede da Escola de Instrução Militar, que está sendo edificada anexa ao Colégio Estadual Casa Jovem, em Igrapiúna, – esta última, uma instituição também ligada ao PDIS.
Denise já participou de diversas obras. Da semana intensa, só reclama da massa nas unhas, uma das poucas vaidades que tem. “O curso mudou a minha vida. Não tinha nenhuma expectativa, agora tenho planos e visão de futuro”, diz a “pedreirinha”.
Oportunidade
Ligada ao Construir Melhor, nasceu a Cooperativa da Construção Civil (Coonstruir), formada pelos aprendizes, cuja remuneração é definida de acordo com a produtividade, gerando trabalho e renda. O presidente da Coonstruir é ex-aluno do Colégio Estadual Casa Jovem. Pedro Rogério da Silva, 25 anos, nascido em Ituberá (BA), conheceu o ofício com seu pai, Raimundo da Silva. “Ele é mestre de obras há 30 anos. Nasci na construção civil.”
Pedro ingressou na primeira turma do Construir Melhor. Apesar de ser quase profissional, desejava aprimorar sua formação. Mesmo sem o apoio de seu pai, que não aprovava a decisão de deixar temporariamente os serviços para estudar, uma vez que passaria a ganhar menos, resolveu continuar. Hoje, no fim do curso, recebe mais de R$ 1.500 e é encarregado da construção da sede da Escola de Instrução Militar. “Meu pai me vê com orgulho dirigindo uma obra sozinho. Agora quer trabalhar comigo, mas digo para ele que está na hora de se aposentar e descansar. É a minha vez de tocar o barco”, diz, sorrindo.
Luan Araújo, 20 anos, compartilha do sonho de Pedro Rogério. “Espero ser um pedreiro qualificado, aumentar a renda da minha família e oferecer uma casa melhor a eles”, conta com empolgação o morador de Valença (BA) e aprendiz da segunda turma do projeto.
De acordo com Christophe Houel, a união do Construir Melhor com a Coonstruir está contribuindo para melhorar a qualidade de vida da população do Baixo Sul. “Queremos oferecer infraestrutura para a região. Aliado a isso, temos a capacitação de agentes multiplicadores da construção civil. Estamos ajudando a retirar muitas pessoas de uma situação de vulnerabilidade”.
Casa dos Sonhos
A primeira turma do Construir Melhor começou suas atividades em junho de 2009 e concluiu o curso em janeiro de 2011. Desafiados a apresentar um projeto em que sintetizassem todo o conhecimento adquirido, os aprendizes elaboraram a Casa dos Sonhos. A ideia é beneficiar uma família do Baixo Sul com uma moradia digna. “Elaboramos desde o desenho das plantas ao levantamento dos materiais necessários. Dividimo-nos em equipes e fomos a campo entrevistar as pessoas. Outra parte da turma foi em busca de patrocínio. A mão de obra será nossa e o material doado por parceiros da região”, conta Denise Batista, uma das autoras da iniciativa.
A família escolhida reside há 20 anos em uma casa de taipa. Os novos pedreiros aguardam apenas a liberação de alvará da Prefeitura de Igrapiúna para dar a notícia. “Sempre disse a eles que seriam os construtores dos sonhos alheios. A realização desse projeto comprova isso. É o resultado de uma formação para a vida cidadã”, destaca Laís Freire, Coordenadora Pedagógica do Construir Melhor.
A capacitação de uma nova turma terá início em maio de 2011. Para fazer parte do Construir Melhor, é preciso ter entre 18 e 26 anos. “Não queremos pessoas já qualificadas, porque nosso desafio é dar oportunidades a todos”, enfatiza Christophe Houel.
Quem apoia o projeto Construir Melhor:
• Fundação Odebrecht
• BNDES
• Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial)
• Sesi (Serviço Social da Indústria)
• Michelin
• Prefeitura de Igrapiúna
• Prefeitura de Valença
• Cooperativa da Construção Civil
• Casa Familiar Rural de Igrapiúna
• Banco do Nordeste do Brasil
• Sindicato da Indústria da Construção do Estado da Bahia
• Caixa Econômica Federal
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